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Se Deus não existe então tudo é permitido – Dostoievski

 

Começo esse texto com uma célebre paráfrase usada por Dostoievski (um grande religioso) sobre a relação que Deus possui com a liberdade humana. Mas antes de adentrar nesse assunto com maior profundidade preciso dizer que a cada novo texto de filosofia que leio, a cada novo filósofo que estudo, a cada dia que passo com um livro em mãos eu acabo chegando a uma conclusão terrível: Que a não-existência de um Deus é muito mais provável do que sua existência. Acima disso, esse assunto está cada vez me trazendo um profundo desinteresse. Até porque, após tomar uma posição de dúvida é muito complicado encontrar um argumento que confirme a existência e a não-existência de um ser divino.

Essas questões são levantadas quando tomamos assuntos como a liberdade, a psicanálise, a ética e a teoria do conhecimento (dentre outras).  Mas antes preciso deixar em evidência o que é esse Deus que estou falando. É a ideia de um ser onipotente, onipresente, e onisciente. A ideia de um Deus corpóreo, seja ele a ideia judaico-cristã, muçulmana  ou os deuses das mais diversas mitologias como Zeus, Odin, Horus dentre todos os outros. A ideia desse deus é de um Ser (seja ele com características humanas ou não) que possa atuar e interferir no nosso mundo. Além da ideia de um Deus criador.

Mas agora vamos tomar como ponto de partida a nossa frase inicial. Muitos religiosos argumentam que a religião é a unica coisa capaz de dar preceitos éticos e morais. Se não existe Deus, não existiria a ideia do bem e do mal. Não existiria nada que daria limites aos seres humanos. Viveríamos na mais completa anarquia, onde, mesmo limitados por leis, tudo ainda seria permitido. Porém, esse não é o ponto em que Dostoievski pretende chegar ao utilizar essa paráfrase atribuída aos irmãos Karamazov. A questão é que sem Deus a liberdade é plena, seriamos então, completamente responsáveis por nossos atos e por tudo que está acontecendo em nossa vida. Não existe mais essa de que a culpa é de Deus, ou as coisas aconteceram porque Deus desejou que fosse assim.

Nietzsche é um grande expoente nessa situação ao usar sua célebre frase “Deus está morto e nós o matamos” (Gaia ciência aforismo 125).  Para Nietzsche o ser humano precisa se tornar senhor de suas próprias ações e se tornar completamente responsável por sua vida. Precisa se libertar de suas dependências. Precisa assumir todas responsabilidades, e não depender de mais ninguém, além dele mesmo. É claro que essa perspectiva é um pouco assustadora, afinal “a culpa dessas coisas ruins em minha vida e de meu sofrimento é completamente minha”, e não são todas as pessoas capazes de assumir plenas responsabilidades por sua vida. Diria Nietzsche, ser um Super-homem é para poucos. É muito mais fácil colocar a responsabilidade em Deus ou em qualquer outra coisa.

A morte de Deus se dá muito mais nessa questão simbólica de Deus, onde ele deixa de atuar como aquele que define o destino das pessoas, bem como o regente moral da sociedade (até porque para Nietzsche Deus nunca existiu de verdade). Esse ser se torna em nada, está morto. E para a sociedade européia da época nada representou senão um resto de algo que já foi, mas que não valia nada. A sociedade não dependia mais de Deus para saber o que era certo e o que era errado, e não estava mais limitada por um Deus para fazer o que bem entendesse e fosse capaz de assumir as plenas responsabilidades.

Quem  desenvolveu mais essas ideias foi Sartre que disse que somos seres condenados a sermos livres. De tudo o que somos como seres humanos somos livres e temos plena responsabilidade por aquilo que fazemos. Se uma pessoa nega sua liberdade, isso ainda é um ato livre, pois tu escolhe não o ser. Tua liberdade é tua prisão. E porque o ser humano é plenamente livre e responsável por suas ações, responsabilizar um Deus por algo que tu fizeste é apenas uma atitude de má-fé (ver nota no final do texto para um resumo da má-fé). O ser humano é responsável por si e pelos outros. Se o mundo está da forma que está, a responsabilidade é tua, é minha, é de todos nós. É da humanidade e de mais ninguém. E se não fizermos nada para mudar, a responsabilidade continuará sendo nossa, diria Sartre.

A liberdade é um tema radicalmente ligado à religião. Mas por mais que as pessoas procurem responsabilizar Deus pelas ações humanas, por mais que a religião procure restringir a liberdade, escolher não fazer algo ainda é uma escolha e somos responsáveis por ela. Somos livres e podemos fazer o que quisermos, nada nos impede disso. Mas também devemos arcar com as responsabilidades. Se Deus não existe então tudo é permitido. E como Deus não existe, tudo é permitido. Mas além disso são duas coisas que quero deixar aos meus leitores. A questão de que somos plenamente responsáveis por quem somos e quem seremos. E a dúvida. Afinal, jamais poderemos saber se Deus existe ou não, mas podemos nos livrar dessa ilusão de que não somos livres! Devemos agir por nós mesmos, somos responsáveis por nossas ações, e não Deus.

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A má-fé de forma resumida é uma mentira a ti mesmo e as outras pessoas. É mentir sobre ser responsável pelas próprias atitudes. Deixar a escolha da liberdade para outra pessoa ou entidade. É deixar que a religião, os pais, o país escolha como tu deve agir e usar a tua liberdade. É claro que é algo que vai muito além, mas de forma resumida é isso.

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